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A Journey through the Desert

( First posted in Portuguese,  in March 2016) For Julia , The Princess with the Green Slippers 'Julia! Bernardo!...

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Sunday, 19 December 2010

A Chave Dourada

           Era uma vez uma linda bailarina que vivia numa caixa de música. Durante muito tempo foi feliz. Todos os dias uma amiga muito querida abria a caixa e ficava a vê-la dançar ao som de O Baile das Donzelas da Corte. Terminada a dança, a amiga contava-lhe como tinha corrido o seu dia – às vezes as histórias eram engraçadas, outras eram bastante tristes, mas, nessas alturas, a amiga dizia: – Vai correr tudo bem!
           Ultimamente, no entanto, a pequena bailarina notava que a amiga parecia definhar: o seu sorriso era triste e os seus olhos não tinham aquele brilho radiante que costumava detectar quando acabava de dançar. Qual seria o problema? O mistério não tardou a resolver-se: a amiga contou-lhe a história da vida e da morte e de como algumas pessoas tinham a felicidade de viver uma vida longa, cheia de alegrias e tristezas, com sorte mais alegrias do que tristezas ... disse-lhe que tinha tido uma vida boa, mas que tinha chegado a hora de deixar este mundo e regressar a casa. Já não poderia ver a pequena bailarina a dançar, mas que ela não se preocupasse pois estariam sempre juntas nas recordações que partilhavam. É claro que a pequena bailarina ficou muito triste. Não queria que a sua amiga partisse ... e o que seria dela? Quem abriria a sua caixa todas as noites para que pudesse dançar? Seria atirada para algum baú velho e a cheirar a bolas de naftalina, ficando aí esquecida para sempre? Mas a sua sábia amiga tentou suavizar os seus medos dizendo-lhe que o fim era apenas o início, que tudo se resolveria ... que, tal como ela, a pequena bailarina encontraria o seu caminho...
           O seu caminho? Que caminho? Para onde? Tantas perguntas foram deixadas sem resposta! Se ao menos fosse uma patinadora no gelo seria livre para ir para onde quisesse. Em vez disso, estava presa numa caixa sem ninguém que a aplaudisse no final da sua dança. Mas ela era uma bailarina muito voluntariosa. Quanto mais pensava no que faria se fosse uma patinadora no gelo, mais acreditava que isso podia tornar-se realidade. Fechando os olhos, imaginava-se a patinar sobre um belo lago gelado e a imagem que criou na sua mente era tão intensa que, um dia, se tornou realidade. Como? Na verdade, isso não tinha muita importância para ela. Ela estava nas nuvens!
           O que na verdade aconteceu foi que a imagem que criou de si própria naquele lago gelado era tão poderosa, que uma série de acontecimentos se uniram para o tornar realidade. É a isto que as pessoas se referem quando falam de sincronia. Neste caso, cumprindo os desejos da velha senhora, os seus pertences foram carregados numa carrinha e levados para o Exército de Salvação (Salvation Army). E, porque tudo aquilo que tem de acontecer, acabará, mais cedo ou mais tarde, por acontecer, uma estrada esburacada/de piso acidentado ajudaria a caixa de música a cair da carrinha, e a colina íngreme lá em baixo permitir-lhe-ia deslizar pela sua encosta, até ao lago gelado.
           Mas nada disto interessava à pequena bailarina. A única coisa que lhe importava era que agora estava ali. O facto de agora ser capaz de mover livremente as pernas também não tinha importância. O seu sonho realizara-se!
           Durante muito tempo patinou na superfície gelada do lago, indiferente a tudo por que tinha passado... até ao dia em que se lembrou das últimas palavras da sua amiga. “Também tu encontrarás o teu caminho ...” De repente, o lago pareceu-lhe pequeno de mais. Por isso, deslizou para o interior do denso bosque, maravilhada com os novos cheiros e ruídos e com algumas criaturas estranhas que se tinham aventurado a sair das tocas nesse frio dia de Inverno. Esse novo e maravilhoso mundo manteve-a distraída durante algum tempo, até se aperceber que, na realidade, estava a patinar em círculos. Estava determinada a encontrar o seu Caminho por isso, envergando o seu lindo tutu cor-de-rosa, subiu a uma árvore esguia e alta…
           Ao chegar ao topo ficou, primeiro, deslumbrada pela claridade do céu e, depois, encantada com as simpáticas nuvens. Uma dessas nuvens parecia estar a gostar particularmente da sua companhia. Voava à volta da sua cabeça como se estivesse a brincar com ela e, depois, quando ela menos esperava, tomava-lhe o rosto nas mãos gorduchas e dava-lhe um beijo ruidoso nas faces rosadas. Que divertido! Quase esqueceu a razão que a levara a subir lá acima. Mal se lembrou, levou a mão à testa, mesmo por cima dos olhos, como um marinheiro a tentar avistar terra, e começou a procurar algo que pudesse ser o Caminho. Nisto, lá longe no horizonte, do lado direito, viu um lindo palácio de cristal. – É isso! É para aí que tenho de ir – disse em voz alta. Mas, mal proferiu estas palavras, viu, pelo canto do olho esquerdo, um ser alado que lhe dizia adeus, do cimo de um penhasco escarpado. Olhou directamente para ele e o calor que tomou conta do seu coração foi tal, que soube imediatamente que era para aí que devia dirigir-se. Desceu da árvore e patinou/deslizou pelo chão gelado até ao penhasco.
          Este não era tão escarpado quanto parecia à distância: estava coberto pela erva mais verde que alguma vez vira e o sol era tão quentinho que a fazia sentir-se segura como quando vivia na caixinha de música e podia ainda gozar a companhia da sua querida amiga.
          Temperança, pelo menos foi isso que julgou ouvi-lo chamar-se, estendeu a mão e deu-lhe as boas-vindas.
          – Tenho estado à tua espera. Tinha a certeza que encontrarias o caminho até aqui – disse ele, e sentaram-se os dois de pernas cruzadas, segurando a mão um do outro e de olhos fechados, escutando o bater dos seus corações. De repente, parecia que não havia mais nada à sua volta, nem sons, nem cores, nem cheiros, apenas o Tum-Tum-Tum dos seus corações batendo em uníssono. Depois aconteceu uma coisa maravilhosa: começaram a levitar, subindo muito lentamente no ar, num movimento espiral.
          – Abre os olhos – disse Temperança, na sua voz suave e musical. – Vê só o que és capaz de fazer! Tu és linda! És mais leve do que uma pena! E estás pronta para receber a oferta que estás prestes a receber. – Do bolso da sua túnica branca retirou uma caixinha embrulhada em papel dourado, cintilante, atado com um laço prateado. Os olhos da rapariga brilham maravilhados enquanto ela puxa o laço. A caixa abre-se rapidamente e dela salta a nuvem brincalhona, depositando-lhe mais um dos seus beijos na face rosada. Então, de pleno ar, como se estivesse a fazer magia, a nuvem puxa uma enorme chave dourada que lhe entrega. Nesse preciso momento, mil e um livros começam a flutuar à sua volta. Há livros enormes, pequenos, livros minúsculos, livros de todos os tamanhos e cores. Sem que ninguém lhe diga, a rapariga sabe que a chave abrirá o fecho de um desses livros apenas. Tem de fazer uma escolha sensata. A chave é tão grande que ela sabe que apenas abrirá um dos enormes e coloridos livros. Mas, em vez de se dirigir aos livros grandes, é atraída para um livro castanho, de cabedal e de tamanho médio e, como se de magia se tratasse, a chave serve-lhe na perfeição. A fechadura abre-se com um click e uma súbita rajada de vento abre o livro numa página que contém duas mensagens:

          1.És linda e capaz de fazer tudo o que te proponhas fazer. Fecha simplesmente os olhos e visualiza-o, sente-o, que se tornará realidade.

          2.Chegaste à linha de partida: podes agora escolher regressar a qualquer mundo que desejes, na forma de qualquer criança, animal, planta ou pedra ...

          Ainda a flutuar no ar, a rapariga fecha os olhos e vê, na sua mente, que é uma...Bem, a experiência é tão forte, que apenas tu, que estás a ler ou a ouvir esta história, pode aceder à mente da menina e ver o que ela está a ver e sentir o que ela está a sentir...Vá lá, fecha os olhos, escuta o bater do teu coração e vive aquilo em que a bailarina/patinadora no gelo se quis transformar..., mas não guardes tudo só para ti, di-lo, escreve-o, desenha-o ou canta-o, mas deita tudo cá para fora, pois só assim é que a sua vida recomeçará.


- COPYRIGHT/Registado no IGAC

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Sunday, 30 May 2010

E SE AS ESTRELAS ACABASSEM?

Sou agnóstica, i.e. não faço a mínima ideia se deus existe ou não. Nunca a vi, nunca a senti. Pois se existe não tem porque ser masculino. A existir, deus até poderá ser uma bela negra amazónica com tendências sado-masoquistas...Quem sabe?
No dia em que a sentir, gritarei a alto e bom som que de católica-nascida-sem-opção e agnóstica-por-falta-de-informação-em-primeira mão, me converti à tal religião.
Para mim, todos os livros religiosos que existem por aí, não são mais do que compilação de mitos, tais como os que existiam na época Greco-Romana. Deus, Alá, Jeová, Júpiter, Zeus...todos nascidos da necessidade de se justificar o injustificável, o desconhecido, o medo, bem como da necessidade em acreditar que esta vida por vezes medíocre e desprovida de sentido vale alguma coisa. Se vale ou não, isso cada um saberá...
Não necessito de ser reconfortada com a ideia de que na morte irei – ou não – ser concedida do privilégio de conhecer a dita cuja, e de poder disfrutar de uma existência serena nos jardins celestiais.
Cá para mim não necessito de me identificar à força com uma religião que, na maioria dos casos, foi criada por homens megalomaníacos com sede insaciável de poder.
Sim, sou agnóstica, mas confesso que não me importaria de encontrar algo que me fizesse sentir, com todos os sentidos e mais algum ainda por descobrir.

A Morte é capaz de ser o único conceito que me intriga, talvez por também nunca a ter vivido. Por isso, não temo a morte, a minha morte, está claro, não a das pessoas que me são próximas.
Naturalmente, como muitas outras pessoas, também me questiono se a morte é o fim ou apenas o começo de uma nova fase na nossa existência. Quando era mais jovem, a morte era apenas o que vinha depois do nascimento-infância- adolescência-idade adulta-e-terceira-idade (ou, então, da hoje em dia tão badalada quarta idade...mas naquele tempo não se ouvia falar desta última) ou que, de forma caprichosa e aliatória vinha em qualquer altura de uma dessas fases, apenas para abalar a aparente ordem natural da vida. Depois de mortas as pessoas eram sepultadas ou cremadas (forma, sem dúvida alguma, mais higiénica e demonstrando uma maior conciência de sustentabilidade e preservação de espaço) e isso era o ponto final dessa vida.
Contudo, com o passar dos anos, talvez através de livros que li, disto e daquilo, e de pessoas que conheci, fui aprendendo a gostar da teoria da reencarnação. Isto não quer dizer que seja uma aceitação incontestável e permanente, mas gosto da ideia. Não do conceito fatalista de alguns de que cá se fazem, cá se pagam, nesta ou noutra vida...mas na concepção de apendizagem para uma evolução espiritual, em que um dia nos tornaremos em nossa própria energia ilunimada (esperemos que não na forma da tal com traços de sado-masoquismo), cujo percurso não terminaria na morte.
Uma ideia louca...E se ao morrerem e reencarnarem as vezes que achassem necessário, a essência das pessoas se transformasse em estrelas brilhantes, no vasto manto nocturno em que nos encontramos a rodopiar?
Mais ainda, e se essa fosse meramente a primeira fase desse estádio iluminado (no sentido lato e abrangente). Isso explicaria que à medida que continuássemos a evoluir nesse novo plano de extistência, a nossa luz escureceria até acabar por se desvanecer completamente, até abraçar uma nova forma de existência...Mais, também explica o facto de algumas noites o céu se apresentar mais estrelado do que outros: quanto mais estrelas no céu, mais seres a terem conseguido alcançar esse primeiro estádio de iluminação; quando o céu se apresente como uma auto-estrada escura como o breu, apenas salpicada aqui e ali de estrelas com efeito catadióptrico, convidando-nos a celebrar a passagem de mais alguns seres feitos estrelas para mais um nível superior de iluminação e abnegação.
Mas – perguntam vocês – e se um dias as estrelas acabassem? Isso certamente quereria dizer que o ser humano já havia vivido o que tinha que viver, aprendido o que tinha que aprender e, naturalmente, estaria num outro ponto do universo, com outra forma, nome e feitio, vivendo, aprendendo e evoluindo com os seus erros e tentativas...
Se o espaço é infinito, também o número e as possibilidades de vidas são ínfimas.